Os jovens — e digo os jovens de todas as classes — estám um pouco a mercê de um sistema que nom conta com eles, que, hipocritamente, fala deles. O 25 de Abril nom foi feito para esta sociedade, para aquilo que estamos agora a viver. Aqueles que ajudárom a fazer o 25 de Abril, que nom fôrom só aqueles que o figérom, imaginárom umha sociedade muito diferente da atual, que está a ser oferecida aos jovens. Os jovens deparam-se com problemas tam graves ou talvez mais graves que aqueles que nós tivemos que enfrentar — o desemprego, por exemplo — e por isso nom tenhem recursos. O sistema ultrapassa-os, o sistema oprime-os, criando-lhes umha aparência de liberdade.
Eu creio que a única atitude foi aquela que nós tivemos — «nós», eu refiro-me à minha geraçom — de recusa frontal, de recusa inteligente, se possível até pola insubordinaçom, se possível até pola subversom do modelo de sociedade que está a ser oferecido. Com belos discursos, com o fundamentamento da legalidade democrática, com o fundamento do respeito polos cidadaos, polos direitos dos cidadaos, é de facto umha sociedade teleguiada de longe por qualquer FMI, por qualquer deus banqueiro, que é imposta aos jovens de hoje. Tal como nós, eles tenhem que a combater, tenhem que a destruir, tenhem que a enfrentar com todas as suas forças. Organizar-se para criarem a sociedade que tenhem em mente, que nom é, com certeza, estou convencido, a sociedade de hoje.
— Excerto de uma entrevista à RTP em 1984.